La città - parte 1 (conto)

Veneza nunca fora para ele a cidade mais bela do mundo, mas por razões profissionais fazia dela uma segunda casa. Para além dos fatos e sapatos tudo o resto o entediava. O tom delicodoce de uma língua que precisa de mímica para se compreender na totalidade, o excesso de monumentos, palácios e casas classificadas onde um elevador não pode ser construído se violar a arquitectura original. A falta de comodidades de uma cidade moderna irritavam-no profundamente. Pior só a péssima cobertura celular, pois as antenas retransmissoras estão proibidas no espaço classificado. Pelo menos ganhava a privacidade como vantagem, a qual não desdenhava.
Mas não é disto que vos quero falar. Estamos no Carnaval e ele nunca perde a oportunidade de se fazer notar. Esta bienal terá um novo formato. Veneza está divida em seis “sestieri”; Cannaregio, San Polo, Dorsoduro , Santa Croce, San Marco e Castello, cada um com o seu procurador. Para retirar pressão à praça de S. Marcos decidiu-se alargar a festividade a toda a cidade, como o era desde 1268. Só o mau gosto dos austríacos, aquando da ocupação da cidade, fizeram com que o Carnaval se perdesse e só fosse retomado em 1980.
Mário, íntimo do procurador da Isola Sacca Fisola, ilha que pertence ao "sestieri" de Dorsoduro, sabe que a oportunidade é única. Fisola está ligada por ponte a uma ilha artificial, Sacca San Biagio, onde existe uma incineradora inactiva. Há muito que ele convenceu o procurador a aí construir um hotel de 7 estrelas, algo só comparável ao Burj Al Arab Hotel no Dubai.
A ambição de Giuseppe Dandolo é grande, quer conquistar a câmara e fazer de Veneza "la città"; a imortalidade está há séculos garantida pela arquitectura e canais, mas falta-lhe a modernidade que lhe devolva o bulício que se perdera nos anos 50 com as cheias. Os novos diques são já uma realidade, o investimento para o seu "sestieri" virá misteriosamente das ligações internacionais de Mário. Dandolo persegue a fama.
Mas hoje é dia de festa, não se falará de negócios, dia para os pavões mostrarem as suas caudas, leques acenados a outras máscaras. Ele não fará diferente.
“Egli è qui!”, ela sorria enquanto repetia a frase, a meia máscara dourada que lhe ocultava a parte superior da face garantia o anonimato. O vestido fora talhado para um corpo que não apresentava mácula, o azul turquesa impelia o pensamento para outros mares, recifes e calores. Olharam todos; miúdos, graúdos, eles e elas, e enquanto ela passava, os olhares, também eles escondidos noutras máscaras, iam deixando cair sorrisos espontâneos de quem se deleita com o belo, com o exuberante. Há mulheres assim, onde a química exala para além da necessária troca de olhares. Aproximando-se de Giuseppe disparou, “Un bacio per te amore mio!” o que o deixou verdadeiramente incomodado; como político sempre fora brilhante; o contraditório, a pequena intriga, a troca de favores foram batalhas ganhas, mas perante mulheres belas a timidez tomava-lhe o pulso.

(a continuar)


6 comentários :: La città - parte 1 (conto)

  1. "[Italian men] are like show poodles. Sometimes they look so good I want to applaud..."

    "'Parla Come Mangi' --It is a common way to say 'be simple', 'don't try to be rhetorical' literaly: 'speak the way you eat'

    Elizabeth Gilbert - Eat, Pray, Love

    So, it should be the same about women...

    Looking forward to read more of this story.

    Assinado:sem máscara

    Anónimo

    24/2/09 08:29

  2. Agora vou me dar á espontaneidade... vinha eu fazer-te um valente comentário á surpresa que ofereces hoje e dou com o comentário do sem mascara, enfim, acho que me baralhei, será que estou a ficar loira e não dei por ela?

    Sei lá, olha, para a leiga deste lado o texto de hoje está um must!

    E que o Carnaval continue!

    :)

  3. sem máscara: show poodles? Daqueles tosquiados que algumas "damas" carregam debaixo do braço? Prefiro carteiras Luis Vuitton ou Hermès (e falo de marcas porque o tema é esse; no Porto falaria de chuços, mas tem chovido pouco... não lhe chamaram lanças porque não calhou) pois dão melhor cor e não lambem quem comprimenta as donas! :D
    Parla come mangi... assim diz o povo que faz a língua viva. O Latim que se lixe! :D Mas descansa, retórica é algo que só está ao alcance dos iluminados e eu vivo na escuridão da ignorância.
    Quanto às mulheres eu acrescentaria: eat without thinking it's your last meal, pray if you believe, love if you dream...
    A história, a ver... vamos! Precisarei de tempo, só isso! :)

    O2: todas as mulheres acabam loiras com o tempo, até a Mary J. Blidge (que tem uma voz que adoro, por sinal!) :D
    Quanto ao must fico agradecido, com a humilde compreensão que o exagero é simpatia! :)
    Que o Carnaval continue! Brindo a isso, mas que parte do Corso dê com o costado atrás das grades... anda por aí muito rei folião a gozar connosco há tempo demais! ;)

  4. Confesso que não é a primeira vez que te visito, mas é a primeira que vou comentar...para agradecer os teus comentários no meu blogue -apaguei o segundo, como me pediste! :)))- para dizer que vou já linkar o teu para cá voltar mais vezes, e finalmente que gostei muito do estilo suave e fluido deste texto!
    Ah...e também adorei a "Barbie Girl" dos Aqua, uns posts mais abaixo, lol! Já lá vai um tempo desde a última vez que ouvi aquela musica (que eu adorava, diga-se já de passagem!)
    Até breve Aprendiz! :)

  5. Un bacio per te.
    Buondi

    Anónimo

    26/2/09 10:37

  6. Un altro per te!
    Grazie Mille

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