Contra tempo

Quero viver 5.000 anos, não ser menor do que a civilização. Cem anos? Uma anedota, um crepúsculo de tempo no relógio deste mundo. Vivemos pouco, nada que me preencha ou surpreenda. Precisava de cruzar amigos em tempos diferentes, manter por mais tempo os que tenho, ganhar novos já nascidos ou por nascer até que a minha memória seja uma história que mereça ser contada.
Temos hoje a net, podemos cruzar a sociedade e encontrar novas empatias, acelerar o processo para identificar compatibilidades. Embora satisfatória não resolve o problema do tempo.
Quero viver mais do que as religiões, conhecer novas disputas e fronteiras, acompanhar um avanço tecnológico que nem daqui a 3.000 anos será possível conceber, ver a espécie a evoluir... e quando o aspecto me trair mudo de invólcro, qual crisálida que pressente a vontade de voar. Fixarei a minha idade nos 35, só os meus olhos me poderão trair, dizem, pois há quem neles leia a alma. Que se lixe... estarei a sorrir, sempre, e haverá um tempo em que nem será preciso falar ou viajar, bastará um click e tudo acontecerá como por magia. Ia lá eu perder esse futuro, dispensar amigos que durem séculos, fazer parte da história vivendo-a; talvez, talvez no final eu me conheça melhor, o carácter amadurece com o tempo.
Sei onde nasci, mas gostava de morrer noutra galáxia, num azul diferente, como um expatriado que se fascina com o pôr-do-sol do seu novo país. Quero andar descalço em praias virgens, sentir um mar que não me afogue, conhecer animais que falem e compreendam, acompanhar vegetações que não estejam reféns das suas raízes. Quero correr sem me cansar, não precisar de comer ou beber, envelhecer sem adoecer, não parar de aprender. Quero o que ainda não sei que quero, nem para que dele preciso, nem como o utilizarei. Fascina-me esta ignorância futura, imprevisível, mas que ninguém negaria.
Esta vida não me chega! Preciso do futuro, pois o passado e o presente já eu conheço e não me surpreende. Serei exigente, egoísta, inconsciente... não, revolta-me a ideia de viver menos do que um cágado, de pertencer a uma espécie que desenvolveu o cérebro num corpo que se degrada sem razão, de não poder misturar inspiração com sabedoria por pertencerem a gerações distintas. Quero que a minha vida se prolongue tanto que a palavra diferença não se aplique ao homem.
E como será a paixão? Provavelmente ainda não nasceu, mas será improvável que em 5 milénios eu não venha a conhecer alguém que justifique o livro da minha vida. Quero viver 5.000 anos...



Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência!



Como será o ritmo, frenético?

22 comentários :: Contra tempo

  1. Viver contra o tempo ou sem contratempos?

    Assinado:Estátua

    Anónimo

    19/2/09 10:32

  2. 5000 anos?!:)
    Não achas que seria uma existência triste? Só se viveres 5000 anos tu...e todas as outras pessoas. Senão já viste o que seria ver toda a gente partir da tua vida...um a um...que horror.Além disso envelhecer assim tanto...não deve ser coisa boa:P Mas pronto, tu mencionaste o fixar da idade nos 35 anos...por isso vejo que até pensaste no assunto - assim pode ser:P

  3. Também me aflige a gota de água que é a nossa passagem pela vida. Fixaria a minha idade entre os 35 e os 40, sem dúvida.
    Ideal seria escolhermos quando estavamos preparados para partir...talvez quando sentíssemos que a vida já não nos poderia surpreender.

  4. Estátua: de preferência as duas coisas, embora o génio da lâmpada me dissesse... esses dois desejos... não os podes trocar pela felicidade?

    Mona Lisa: não! :) Pensa assim; os nossos antepassados, e até nem é preciso recuar muito, tinham uma esperança média de vida de 30 anos. Já quase que triplicámos esse valor, o que diriam eles de nós?
    Quanto aos outros, e nisso fui explícito (amigos que durem séculos), desejo-lhes o mesmo que a mim, neste caso 50 séculos! :D
    Com o avanço da tecnologia será fácil imaginar uma quase eternidade, onde nenhum acidente será fatal, onde a nossa memória possa ser reconstruída... quanto à alma, bem, se ressuscitarmos tecnicamente o que se poderá dizer da alma... eu disse que queria viver mais do que as religiões! ;)
    Quanto aos 35, acredita, não seria para todos... de facto, é importante haver avós; ok... dou de barato, os meus últimos 500 anos poderiam ser com a idade de 70, mas com a saúde de 40! :P

    Ana GG: eu não gostaria de escolher a data da minha partida; essa incógnita deixava-a para o acaso algures nos 5000 anos. Contudo, gostaria de partir sem saber, sem sofrimento, de repente, embora ao fim de 5000 anos ninguém morra de repente! :D

  5. Gostei essencialmente do modo como te revelas... sim, não foi a necessidade de viveres 5milanos, :)... mas tudo o resto que focas nos entretantos... pessoa interessante... pq não, bora ter 35 para sempre(!) estás adicionado!

    zás!

    Anónimo

    19/2/09 14:31

  6. tb quero viver 5000 anos...quer dizer, na verdade me contentava com um pouco menos, desde que fossem bem vividos...pq a gente vivwe numa correria danada que mal ve o bendito do tempo passar!

    tb curti o seu blog...é de Portugal??

    beijos

  7. Quero viver 5000 mil anos, tal a forma como o descreves...uma escrita maravilhosa que me deixou perplexa a contemplar o tempo!
    Adorei!!!
    Beijo doce

  8. Uau! Um comentário capaz de deixar corado o mais ignorante dos aprendizes! :)
    Também gostei do teu blogue, já que estamos numa troca de galhardetes, embora eu prefira chocolates... manias!
    Volta sempre, este é um espaço onde quero aprender com todos.

    Beijo chocolate

  9. se vivesses 5.000 anos estarias a escrever agora um post desejando viver 30.000 anos!
    Tudo é relativo e queremos sempre mais.

  10. mfc: provavelmente, mas acho que devemos ir de meta em meta (os chamados quick-wins)... e pedir 5000 anos não me parece pouco... não achas? :)

  11. 5.000 não deve ser tão bom.
    Como no primeiro comentário, você vai presenciar a morte de diversas pessoas que te cercam, que você ama. Ai, mó triste.
    Acho que quando essa "super técnologia" chegar, vai ser muito sem graça. Imagine o sedentarismo, cada clique é um prato lavado ou um chão limpo. Nossa, engordaríamos pacas DD:

  12. Bertonie: meu caro, hoje vivemos menos e vemos as pessoas a desaparecer na mesma proporção. Uns vão antes de nós, outros irão depois de nós; era assim, é assim, será sempre assim... excluindo o dia do juízo final para quem for crente. O fantástico, a meu ver, é saber que vivendo mais e com qualidade teremos mais oportunidades de nos reeinventarmos, mais amigos com quem nos iremos cruzando, mais viagens a fazer, mais de tudo, mais!
    Imagina o que será viver num tempo em que pratos lavados e chãos limpos são dados adquiridos, terás todo o tempo do mundo para fruir e o trabalho será tão automatizado que só teremos o benifício de pensar, de inventá-lo, mas não a necessidade de executá-lo, seja ele qual for. Imagina que se substitui o trabalho por conhecimento, contemplação, e que tudo isso nos permitirá crescer e criar novos desafios, mas sem o esforço da rotina! :)
    Quanto à gordura, meu caro, nesse tempo os corpos serão todos perfeitos, ou quase... :D O que nos distinguirá será o intelecto e sobretudo a forma como o utilizamos! Falo da inteligência emocional, porque a outra é simples!

    Abraço

  13. Vi agora que me esqueci de responder a 2 comentários, imperdoável! :)

    O2: imagina isto tudo sem necessidade de uma garrafa de oxigénio sempre atrás! :p Se sou interessante, bem, depende da perspectiva e da luz... mas se olhares para a sombra verás algo mais interessante! :)
    Obrigado pela adicção, afinal a escrita e a leitura sempre são vícios saudáveis e recomendáveis!
    Beijos

    Lili: sim sou português, vivo neste país maravilhoso que muitos de vós vão aprendendo a conhecer. E se passeares na Linha (estrada marítima que liga Lisboa a Cascais) encontrarás nos espaços de lazer, eventualmente, mais conterrâneos do que portugueses. "Dá p'ra ver, né, vida boa e muito chopinho! Sacanagem... tem muito portuga também!" :D

  14. Quem muito pede... mas pensado bem...se e p desejar que se deseje ao maximo. Gostei da tua escrita.
    Bjs meus

  15. Avid: nem mais, nunca sejas parca no pedir porque terás sempre menos... ou não! ;)
    Volta sempre; Moçambique está no meu imaginário... eu que adoro mergulhar! :)
    Bjs

  16. Ler o teu post e pensar que a mim me apetece não viver mais, faz-me sentir ainda pior..

  17. MimiRose: Que disparate é esse??? Antes de mais, vê o meu post seguinte para sentires que até nas coisas mais pequenas encontramos razões para vivermos. Se não gostas do teu "eu" reinventa-te, muda de amigos, muda de trabalho, muda de vida... mas nunca, nunca, questiones o privilégio de a teres! Basta olhares à tua volta com alguma atenção para encontares outros com razões para queixume, azedume e desespero bem pior do que o nosso... tudo é relativo, tudo, o fundamental é sabermos que somos capazes de ultrapassar tudo, acompanhados, sozinhos, contra ventos e marés... o segredo é acreditar em nós, avançar sem medo e saber, essencialmente, que nos podemos reinventar, sempre, várias vezes, as que forem necessárias... não querendo ser vulgar, diria: "não chores por não veres o sol, as lágrimas vão-te esconder as estrelas!". Sorri, a vida pode começar agora!
    Beijo doce

    P.S. Sempre que estiveres triste podes escrever aqui ou enviar-me um email; afinal, esta comunidade deve valer para alguma coisa! :)

  18. Eu não quero viver 5000 anos!!!

    Seria horrível depois de descobrir essa paixão ficar os restantes 4904 anos da minha vida a viver de recordações.

  19. Lurba: vais descobrir a tua paixão aos 96 anos? E porque razão haveria ele de viver menos do que tu? Mas mais vale ser raínha por um dia do que princesa toda a vida... ainda há esperança!

  20. Aprendiz, antes de mais, adorei o teu blog, como escreves e te exprimes, é curioso como através de meras e tão poderosas palavras se consegue transpor tanta barreira, foi exactamente isso que senti ao ler este teu desabafo, se é que o posso descrever assim. Na perfeita utopia que é o teu texto, acredito que todos os seres, humanos, animais, vegetais, até aqueles que ainda desconhecemos, desejem uma existência livre dos tic-tacs dos ponteiros, o nosso carrasco permanente e o nosso maestro invisível. Até lá só posso desejar contigo que essa possibilidade se manifeste, eu, que afirmo querer chegar pelo menos aos meus míseros 100 anos, menos que isso é inaceitável!!!

    Beijocas

  21. Tem maior alcance o teu texto, do que a mera expectativa do "como será"... Se bem que tocas no que quero dizer. Penso por vezes que somos demasiado bem construídos para tão pouco tempo de existência. Não concordas? Quando vês monumentos, visitas países ou simplesmente te cruzas com pessoas ou reparas numa qualquer publicidade ou na entrada de um edifio, ou hotel, ou... nao reparas que é demasiada coisa, demasiado mundo para tão pouco tempo de existência? Não é tanto a expectativa do como será, mas o lamento de não haver tempo, que me despertou curiosidade no teu texto, como sempre bem escrito, embora só agora tenha tomado contacto com a tua página. Uma belíssima surpresa e nao sejas modesto no teu título (do blogue) , embora em boa verdade todos sejamos aprendizes da vida...

    Abraço ;)

    Daniel

  22. Karochinha: adorei o teu comentário, completa o que eu disse, completamente! :) 100 anos? Há que aproveitá-los bem. :)

    Daniel Silva: concordo! Recordo a tristeza expressa pelo José Megre numa reportagem, um homem que teve a ventura de visitar todos os países excepto um, o Iraque, o qual só pode ver através da fronteira uma vez que não o deixaram entrar. O homem levasse essa lástima, eu levarei muitas mais, seguramente! :)

    Abraço

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